domingo, 15 de junho de 2008

A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS

por Anália Maia

Markus Zusak surpreende, não só pelo ineditismo, mas pelo lirismo incontestável de sua narrativa.

Em meio ao caos de uma Alemanha sob o poder Nazista, em um bairro do subúrbio de Munique, na Rua Himmel, uma menina tem sua leitura de Mundo efetuada pelas palavras. Quando chega a casa da família Hubermman, Liesel não sabia ler, apesar da idade em que outras crianças já dominavam a leitura. Com a ajuda do pai (por adoção, tocador de acordeon) a menina aprende as Letras, decora as palavras, rouba livros (seu único prazer verdadeiro) e transforma a leitura em momentos de calma (para os que estavam nos abrigos esperando as bombas cairem), para a mãe que perdeu um filho na guerra e outro pelo suicídio, para o judeu abandonado no porão escuro e úmido de sua casa.
Zusak faz de sua obra uma ode à palavra, dá-lhe materialidade e poder. A narradora é a Morte, que logo nas primeiras páginas avisa: "Você vai morrer." Apesar da observação óbvia, muitas vezes nos esquecemos desse pequeno detalhe. A narradora se confunde com a personagem título. Algumas vezes, no decorrer da leitura, nos distanciamos da realidade narrativa e viajamos no lirismo da morte e de Liesel. " UMA PEQUENA TEORIA - As pessoas só observam as cores do dia no começo e no fim, mas para mim, está muito claro que o dia se funde através de uma multidão de matizes e entonações, a cada momento que passa. [...] Amarelos céreos, azuis borrigados de nuvens. Escuridões enevoadas. No meu ramo de atividade, faço questão de notá-los", diz a narradora em uma de suas inúmeras digressões.

Minha leitura foi rápida demais, senti um grande pesar ao ler, na última página, a última linha da narradora: "A ÚLTIMA NOTA DE SUA NARRADORA - Os seres humanos me assombram." E foi nesse momento que me identifiquei com a nobre Senhora. Respondi em voz alta: a mim também. Como o nectar almejado e finalmente alcançado, tentei saborear cada parágrafo, cada palavra, mas a leitura terminou, com a frase inesquecível da Morte.
Suzak me surpreendeu com a delicadeza poética com que tratou da pior época da história do povo Alemão. As atrocidades nazistas, as dificuldades do povo pobre e abandonado, dos bombardeios que tudo destruiram, das inúmeros mortes que ocorreram no decorrer da narrativa, dando à Senhora Morte um trabalho excessivo, cansando-a até à exaustão.
Todos os personagens são importantes, em todos sentimos a proximidade do conhecimento humano, identificamos, em cada um deles, um conhecido, um amigo ou um parente. Mas alguns me tocaram particularmente: o judeu Max, escondido no porão do pai de Liesel, sua relação com a menina que roubava livros é especialmente poética. O lírismo dessa amizade transborda das páginas dessa maravilhosa obra literária.
Preso no porão, sem ver a luz do dia, sem poder olhar o céu, Max aproveitava os momentos em que o povo ia para os abrigos contra bombas para olhar o céu. Arriscava a vida pelo momento sublime de ver e sentir as cores das nuvens, a brisa azul que lhe tocava a face encovada pela fome e pelo medo.
Mais uma digressão - da narradora ou de Liesel? - "UMA IDÉIA BONITA - Uma roubava livros. O outro roubava o céu." Quando Max ficou doente, a menina que roubava livros, todos os dias, trazia algum presente para ele, que apesar de inconsciente, deveria gostar da atenção daquela criança alemã. "uma fita, uma pinha, um botão, uma pedra, uma pena, dois jornais, um invólucro de bala, uma nuvem [...] como se dá a alguém um pedaço de céu? [...] Decore-a. Depois, escreva-a para ele." disse-lhe o pai, um lindo poeta.

Assim viviam aquelas crianças, no medo, em meio a bombardeios, convivendo com a morte. E em tudo isso encontravam alegria e momentos de amor e amizade. E o poético sempre presente.

O livro, de 500 páginas, é encantador. Gostaria de continuar escrevendo, transmitir todo o sentir que ele me despertou, dividir com vocês as inferências, as mudanças pelas quais passei, nesta leitura prazerosa e bela. Mas não posso, o que posso, e devo, é indicar a leitura desta obra magnifica. De uma beleza delicada, que, num mundo tão individualista, frio e indiferente no qual estamos vivendo, nos deixa o sabor de uma humanidade profunda, de seres que erram, que pecam, mas que possuem o amor incondicional, que são solidários com a dor do outro, e que não perderam a capacidade de indignação.
Poderia escrever por muitas páginas ainda, mas vou parar por aqui. Sei que muitos de nós não possuem muita paciência para ler, estão acostumados com as informações instantaneas das imagens, se perderam das palavras. Palavras que para Liesel eram a própria vida, a tecetura de sua vida era efetuada pelas Palavras que tanto amava e odiava, como ela mesma diz: "[...] Odiei as palavras e as amei, e espero tê-las usado direito."

3 comentários:

Anônimo disse...

Já comprei "O caçador de pipas", mais ainda não li.. rssss. Gostei do seu relato do livro "A menina que roubava livros" e sem dúvida vou comprar por sua indicação!

Bjs!
Nilo.

Anônimo disse...

Oi maninha,
É sempre um prazer visitar o seu "registros maduros", tenho é tristeza em ñ poder estar mais próxima de vc p curtirmos juntas os livros, os passeios, os filmes, os teatros, a vida!
Isis

Anônimo disse...

fiquei muita saudade de voce ,de toda sua essencia , como voce é linda amiga ....como escreve bem.......que fotos maravilhosas......que sensibilidade......é isso aí .....e voce é tudo e muito mais.Amiga, irmã,voce me deixou bolada ......estou muio emocionada....te amo .beijos

telma