sábado, 29 de novembro de 2008

A Cura de Schopenhauer

Em 2005 tive meu primeiro contato com Irvin Yalom através da leitura do seu livro mais conhecido, Quando Nietzsche Chorou. Devo confessar que fiquei encantada, não só com a narrativa fluente e clara, mas principalmente pelo excelente trabalho de pesquisa e credibilidade que envolvia a famosa personagem. Irvin humanizou um Nietzsche que chegou até nós, leigos, como um um louco excêntrico. "Quando Nietzsche Chourou" faz parte da relação das leituras que ficaram gravadas no meu universo interior.
Agora termino a leitura de A Cura de Schopenhauer, do mesmo autor.
Um livro de qualidade, como parecer ser a marca de Irvin D. Yalom, com narrativa carregada de emoção. A terapia de grupo é o epicentro onde Philip (o Schopenhauer simbólico) é tratado por Julius (um terapeuta moribundo). A terapia é intensificada pelo prazo de validade do grupo, que é comunicado da doença terminal do psiquiatra que possui apenas um ano de vida saudável. A obra inteira se resume nisto. No decorrer dos trabalhos terapeuticos vamos participando dos problemas existenciais dos elementos do grupo, todos envolvidos pela aurea do sexo, início e fim de todas as patologias (princípio freudiano com raízes em Schopenhauer).
Schopenhauer está no grupo (representado por Philip) porque precisa curar seu isolamento, seu pessimismo e sua descrença na natureza humana que chama de "Bípedes". Durante a leitura somos agraciados com a história da vida (em capítulos alternados) de Arthur Schopenhauer, que dá o embasamento ao leitor para efetuar a leitura psicanalítica da personagem.
O livro é bom, merece ser lido até o final, mas não deixa aquele gosto típico das leituras inesquecíveis. "Quando Nietzsche Chorou" é a OBRA do autor, o marco na produção literária de Irvin D.Yalom, e como tal, incomparável.

sábado, 15 de novembro de 2008

FUGALAÇA - Mayra Dias Gomes


"[...] Era sempre igual. Sempre a insatisfação, sempre a espera, sempre a preguiça, sempre o ócio, sempre o medo, sempre a mutilação, sempre a solidaõ e sempre as vozes. Sempre os excessos. Sempre me perdia em caminhos desconhecidos procurando razões, razões demais. Sempre esperava que algo me salvasse de mim mesma, esperava demais. Sempre me entregava à paralisia e à letargia, me entrega demais. Sempre deixava de falar ou de fazer, calada pelas expectativas medrosas, medrosas demais. Sempre vagava em multidões, olhando sem ver, se sentindo sozinha, sozinha demais. Sempre ouvia os sussurros berrantes das vozes na minha cabeça, prestava atenção demais. Sempre me julgavam excessiva e eu tantava me provar demais. Sempre demais. Mas eu só estava sendo eu mesma, e este só não é nenhum excesso. Este só não é demais.[...]"
Só quem vivenciou as experiências narradas pela adolescente de 16 anos - Satine - pode entender o significado da "dor". Identifiquei atônita, na obra de Mayra, então com 17 anos, a minha própria adolescência. Solidária com a "dor" da personagem, que se confunde com a dor da autora, vivenciei minha própria "dor". Também sofri, e sofro, com a incompreensão, com a indiferença, com a solidão mais profunda, a solidão da ausência de interlocução. O pior, e para Satine/Mayra ainda é uma incognita, é que o tempo passa, as rugas surgem, a pele se torna lisa e sem elasticidade, cai tudo, a bunda, os seios, a esperança, as ilusões... mas a única coisa que não muda, que permanece, é a "dor". A maturidade nos dá maior controle sobre Ela, mas sabemos que está lá, no coração e na mente.

"[...] Na verdade a batalha não é entre o Bem e o Mal. A guerra não passa de uma confrontação do Coração com a Mente. A mente, lá em cima na cabeça, acha que é superior ao coração e mesmo quando ele dói ela ordena que ele continue. [...]"

Satine corta os pulsos, não é para se matar, para provocar uma dor física que supere a insuportável dor emocional. Mas corta fundo demais e o seu gesto se torna uma tentativa de suicídio. Mais uma vez fazem uma leitura simplista de seus gestos. Descontrolada, imatura, viciada, enfim, rótulos que sequer arranham a essência do sentir da personagem.

Uma menina de dezessete anos, filha de Dias Gomes e Janete Clair, escreveu o livro e publicou em 2007 pela editora Record.

A AUTORA

"Existem doses fortes de realidade e doses fortes de ficção neste livro. A história é um mesclado daquilo que vivi com aquilo que presenciei. Seja através de pessoas que passaram pela minha vida ou através da minha imaginação. Satine é meu alter-ego, o outro eu - aquele que posso controlar e dirigir. Posso minimizar, maximizar, dramatizar, romantizar ou modificar sua história. Há uma grande semelhança com o mundo em que vivi, pois escrevo sobre o que sei e o que sei faz parte de quem sou. "

sábado, 8 de novembro de 2008

O JOGO DO ANJO

Ruiz surpreende mais uma vez. "O Jogo do Anjo", apesar da publicação posterior ao sucesso de "A Sombra do Vento", antecede-o no tempo. O cenário ainda é Barcelona, dessa vez a Barcelona dos anos 20. Nas páginas de "O Jogo do Anjo", conhecemos o avô de Daniel Sempere e sua mãe, Isabella, que no livro anterior é o gatilho da trama cujo filho é o protagonista.

O cemitério dos livros esquecidos é apresentado a David Martin - menino pobre, sofredor e pretenso escritor apaixonado por livros - que protagoniza a história de mistério e suspense que o autor nos apresenta nas 400 páginas de narrativa hipnótica, por Sempere avô.
Sob a ótica acadêmica literária, "O Jogo do Anjo" é uma obra mais elaborada, trabalhada com esmêro e tecida com o cuidado e a paciência da lagarta da sêda. Mas perde para o lirismo transbordante de "A Sombra do Vento". Os personagens nebulosos contam uma história fantástica que no avançar da leitura vai se desvendando. No entanto, apesar do autor dizer, acreditamos que o que diz não é, e buscamos - à cada página virada - a grande revelação. Quando ela é desvanda? Será que devo contar?.......... Acho que não.
Leiam o livro!

SÓ ENCONTREI A CAPA EM ESPANHOL, MAS A OBRA JÁ ESTÁ A VENDA EM PORTUGUÊS.