sábado, 31 de maio de 2008

AQUELES CÃES MALDITOS DE ARQUELAU

por Anália Maia
Descobri um sebo pertinho do meu local de trabalho. Um lugar maravilhoso, que possui um acervo fantástico. Agora, sempre que posso, na hora do almoço dou uma passada lá e saiu carregada de livros. Dá um pouco de trabalho. Como estou interessada em novidades, já que me libertei do compromisso acadêmico da leitura, tenho que ler as orelhas, capas, e, muitas vezes, se houver, o prefácio. Leva algum tempo para identificar as obras que me interessam.
Assim foi com “Aqueles cães malditos de Arquelau”. Pelo título seria difícil identificar a trama, o foco da narrativa. Mas, após passar os olhos pelas partes estratégicas do livro, levei-o para casa, juntamente com outros cinco volumes.

Dos livros adquiridos escolhi “Aqueles cães...” para efetuar a primeira leitura. Não me arrependi, ótima escolha.

Descobri um autor que não conhecia, Isaias Pessotti, um intelectual fabuloso, sensível e de vasto saber que me levou numa viagem fascinante à Itália (Milão) na companhia de personagens incríveis, professores e pesquisadores da Instituição Galilei, voltada para a pesquisa, preservação e administração de livros raros e antigos.

Emílio, o latinista do grupo, narrador, nosso guia pelo mundo universitário e da pesquisa, com humor refinado e muita sensibilidade, descreve com perfeição e detalhes os belíssimos lugarejos que circundam Milão.

Durante a leitura temos erotismo, mistério, verdadeiras aulas de história, teologia e muita informação sobre a nobreza da Itália do século XV.

Os bons livros exigem mais de uma leitura. Com certeza é o acontecerá com esse Pessotti. Na primeira leitura o aspecto que mais me afetou foi a tradução do Commentarium, manuscrito escrito pelo Cardeal Lutércio (nome dado pelo povo simples de Monteferrato – cujo o verdadeiro nome era Ludovico Terzo, que abreviado é LuTerzo, que para Lutércio foi um suspiro do tempo popular). Nele pude reencontrar um autor clássico que sempre me emocionou, principalmente pelas figuras femininas de suas peças. Eurípides, o “Cavalheiro da Paixão”.

O aspecto principal do livro é a tradução que Emílio efetua do original em latim encontrado na Villa onde viveu o Cardeal. O Commentarium constitui a defesa e o resgate do filósofo (destituído do título por Platão e Aristóteles) que cantou a natureza humana em toda a sua crueza, "[...] porque a grande aventura humana já não consiste no desafio ao destino ou aos deuses, ou no morrer por sua pátria, mas na impossível fuga da condição humana. A inevitável marca do humano: a contradição, a irremediável convivência entre a grandeza e a fragilidade, entre a abnegação e a mesquinhez, a coragem e a covardia. Entre o projeto e o acidente. Entre o conhecer e o poder. A sabedoria e a paixão. Eis a grande e sublime tragédia humana. [...]", um documento testemunha da importância do maior poeta clássico da antiguidade.

Pessotti tece o texto apontando as contradições entre o humano e o conhecimento, demonstrando que, ao contrário do entendimento de Aristóteles, a formação do saber científico é fruto da paixão humana.
“Aqueles Cães Malditos de Arquelau” – uma referência à morte trágica de Eurípedes no seu exílio na Macedônia a convite do rei Arquelau – é o romance de estréia de Isaias Pessotti, nascido na cidade de São Bernardo do Campo, formado em filosofia pela USP em 1955, professor e pesquisador de Psicologia. Dedicou-se por muitos anos ao estudo sobre a história da loucura, o mais importante do gênero realizado no Brasil. Pessotti enveredou pela ficção após os 65 anos, idade com que publicou sua primeira obra, à qual seguiram-se O Manuscrito de Mediavilla, em 1995, e A Lua da Verdade, em 1997, todos pela Editora 34.

Dois fatos para mim estão certos: primeiro, efetuarei mais uma leitura do livro e, segundo, comprarei outros da lavra deste maravilhoso autor que acabei de descobrir.

8 comentários:

Anônimo disse...

Querida Anália,

Parabéns – está muito bom.

Beijos, Olavo

Anônimo disse...

Querida Anália,O seu blog é muito interessante. Ainda mais para mim que, quando posso dedicar-mea literatura, só faço aquela velha releitura nos nossos clássicos, para tentar"limpar o idioma", como disse um escritor a respeito de Machado. Por issosuas sinopses são muito benvindas. Assim como a dos filmes.

Um saudoso beijoDelano

Anônimo disse...

Querida Anália,
Finalmente, pude ler sua página. Gostei muito! Bons comentários, boas reflexões e ótimas sugestões. Vou ficar freguês.

Beijos.

Anônimo disse...

Sua paixão é contagiante. Adoro ler seus textos.

Beijos

Márcia

Unknown disse...

Anália


Sinto saudades de nossas conversas...Adoro sua maneira de traduzir tudo que vê!!!

Um grande beijo!!

Eber

Anônimo disse...

Querida Amália seu blog é ótimo. Tem belas dicas e textos maravilhosos. Um beijo grande e Parabéns!

NICE ABREU

Unknown disse...

Continua sendo uma aula. Só mudou a forma e os meios, mas é a mesma professora apaixonante que me ensinou a gostar de literatura.

bruxo niederauer disse...

Anaia! Legal este teu blog. Estou construindo o meu que será de música,literatura e cinema.Já postei discos. Este livro eu li à época do lançamento. É fantástico! me remeteu à lembrança do clássico do Umberto Ecco, embora em épocas diferentes.Como tava procurando subsídios sobre ele, cheguei até aqui.